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30 de novembro de 2010

Kuito nasceu em Belmonte

publicação original
12.09.2006
[url] http://geohisthariabie.blogspot.com/2006/09/kuito-nasceu-em-belmonte.html



ANTES
crédito: MGV
www.sanzalangola.com


O Kuito, antiga Silva Porto, é o paradigma acabado e perene da Guerra em Angola. Nenhum outro lugar sofreu tanto. As feridas estão ainda escalavradas e demorarão a cicatrizar. E será possível?
Admário Costa Lindo

A velha Belmonte, coração central de todo o território angolano, passou a designar-se Silva Porto em homenagem ao grande sertanejo António Ferreira da Silva Porto.

Era Silva Porto uma linda e airosa cidade de ruas e avenidas largas e bem delineadas, jardins floridos e arborizados que lhe davam encanto incomparável. A bela capital do Distrito do Bié, com graciosas vivendas, variadíssimas repartições públicas, casas comerciais dos mais diversos ramos, uma linda igreja, hotéis, bares, pensões, clubes, cinemas, jardins, parque infantil, escolas, colégios, liceus, gráfica, piscinas, hospital, diversos bancos, etc., etc., era uma cidade em franco progresso. Dista 7 quilómetros da sua estação ferroviária – Gare. Altitude 1.687m.

O seu local mais significativo era, sem dúvida, a Embala de Belmonte, local onde viveu e morreu Silva Porto e ainda a estátua erguida em sua memória no centro da cidade. O seu feriado era comemorado a 24 de Agosto.

O Instituto Moderno foi o percursor do ensino secundário no Bié, tendo sido mais tarde transformado em Instituto Liceal e posteriormente em

Colégio dos Irmãos Maristas, cujo director era o famoso senhor Cordeiro. Angola inteira poucos liceus tinha desta craveira: apenas um em Luanda e outro em Sá da Bandeira.

Liga dos Amigos de Silva Porto – Foi seu presidente e fundador o sr. António Teixeira da Costa, mais conhecido por Teixeirinha. A ele se ficou a dever a reconstrução da Embala de Belmonte e a construção da estátua erguida na cidade em memória de António Ferreira da Silva Porto; também a ele se ficou a dever a restauração do Mausoléu de Silva Porto, no Cemitério da Lapa na cidade do Porto. Não fosse a intervenção deste bairrista o mausoléu estaria em riscos de desaparecer.

A Mansão dos Velhos Colonos foi uma obra meritória criada em 1945 pelo então Ministro das Colónias, Professor Doutor Marcelo Caetano, destinada a recolher os velhos colonos de toda a Angola.

O Rádio Clube do Bié, desde 1948, indicativo de chamada CR6RO, frequência em quilociclos 4842 e 7105, onda de 42 metros, era ouvido em todo o Distrito e não só; lembramo-nos dos seguintes locutores: Luciano Sena, Saraiva de Oliveira, Fernando Teixeira, Jorge Cubanco, Maria Cármen, Santos Ferrão, Odete Ferrão.

O Colégio de Nossa Senhora da Paz (cuja madre superiora foi a Irmã Maria Margarida e, mais tarde, a Irmã Ana Maria), o Colégio dos Irmãos Maristas, o Ninho dos Pequeninos, a Mansão dos Velhos Colonos, a Escola do Magistério Primário (cujo Director era o Dr. Edgar Panão), o Hospital Central, o jornal A Voz do Bié, as sedes dos seus clubes, o cinema, etc., foram obras criadas com garra e amor, por quantos tiveram o privilégio de as criar e dirigir e cuja função teve papel preponderante no desenvolvimento da linda cidade de Silva Porto.

Recordamos ainda a Rádio Reparadora do Bié (propriedade do sr. Lhorente), mais tarde denominada Fadiang, que expedia milhares e milhares de discos (em especial merengues) para toda a Angola.

O aeroporto de Silva Porto denominava-se Aeroporto Engenheiro Carloto de Castro.(1)
Perto deste situava-se a unidade militar aquartelada na cidade – Os Dragões de Angola – que deu grande desenvolvimento a Silva Porto.

Apontamentos de interesse sobre Silva Porto
Em 1786, no governo de Sousa Coutinho, foi iniciada da fundação do Bijé.

Em 1840 Silva Porto estabeleceu-se no local a que deu o nome de Belmonte.

Por Decreto de 24 de Janeiro de 1891 intitulou-se a Capitania Mor do Bié – derivado de Bijé – sendo instalada em Belmonte, no Forte de Silva Porto.

Por Portaria de 15 de Janeiro de 1904 foram extintas as capitanias-mores do Bié e do Bailundo e substituídas por concelhos.

Em 1905 teve Comissão Municipal e em 1910 já tinha dois hotéis.

Houve uma Liga Nacional de Instrução que mantinha uma professora a qual recebia em sua casa filhos dos comerciantes dos arredores.

Em 1911 fundou-se a Associação Comercial do Bié, com estatutos aprovados no ano seguinte.

Em 1919 foi criada uma agência do Banco Nacional Ultramarino e instalou-se um quartel de tropas extraordinárias. Começou-se a construção de um hospital e surgiu o Teatro de Silva Porto, modesta casa de espectáculos mas que deu vida ao meio.

Por Decreto nº 63 de 9 de Maio de 1920 foi criada a Câmara Municipal do Bié, que ficou instalada em 1922.

O Decreto nº 134 do Alto-comissário, de 1 de Maio de 1922, criou o Distrito do Bié, compreendendo os concelhos do Bié, Andulo, Alto Cuanza e Ganguelas, passando Belmonte a denominar-se Vila Silva Porto; nesse tempo havia três cidades em Angola: Luanda, Benguela e Moçamedes.

O ano de 1924 foi notável para a economia da região, fundando-se Silva Porto-Gare, sendo de lamentar (parece-nos) que nessa altura não mudasse Silva Porto para o local da estação pois que em Silva Porto ainda não havia muito a perder.

No tempo do governador Coronel Lopes Mateus foi a vila elevada à categoria de cidade pelo Diploma Legislativo nº 740, de 31 de Agosto de 1935.

Em 1936 a Câmara mandou construir um edifício para o Tribunal e em 1938 organizou os serviços de luz e água.

Por Bula Pontifícia de 4 de Setembro de 1940 foi criada a diocese de Silva Porto, sendo seu primeiro Bispo Dom António Ildefonso dos Santos Silva.

Por Portaria 9931 de 1957 foi-lhe dado foral.

A Reforma Administrativa de 1937 criou a província do Bié. Com sede em Silva Porto, mas o Decreto nº 28.858, de 1954, acabou com a divisão em províncias e criou o Distrito do Bié-Cuando Cubango, definindo-lhe os limites a Portaria nº 8.094 de 1955.

(Estes Apontamentos que reputamos de interesse foram extraídos do Dicionário Geográfico-Comercial de Angola – Antonito, datado de 1959, gentilmente cedido pelo Senhor Eurico Afonso Silva)
de
ALCOBIA, Filomena. O Nosso Bié, ed. A., Coimbra, 1990, pp. 23/25-30/31.



(1) actualmente Aeroporto Joaquim Kapango.

29 de novembro de 2010

1482. a Chegada de Diogo Cão

Em 1482, chegaram ao Congo os primeiros portugueses, comandados por Diogo Cão. Estes homens encontraram congoleses e quiseram fazer conhecimento com eles. 1, 2

O rio Poderoso 3

Em seguimento da sua política de expansão. D. João II mandou, em 1482, uma pequena frota, comandada por Diogo Cão, escudeiro da casa real, continuar o descobrimento da costa africana, para cá do cabo de Santa Catarina, última etapa atingida por Rui de Sequeira.

O neto de Gonçalo Cão deixou o Tejo em princípios do ano, com um número desconhecido de navios, mas não superior a três, em direcção à Mina. “lugar onde se podia prover de alguma necessidade”.4 Trazia consigo mercadorias e presentes, para comercializar e homenagear os potentados do percurso.

As instruções régias condicionavam-lhe o andamento ao longo da terra, para tomar contacto com as suas gentes, com as suas possibilidades, com as suas rotas e conhecenças; e, cumprindo-as, viajou cautelosamente, para afastar perigos possíveis, sendo vítima, apenas, dos temporais.

Diogo Cão visitou e baptizou, entre outros, estes lugares: As Duas Moutas (Mamas de Banda), a Praia Formosa de São Domingos (Loango), a Praia Branca (Lândana), a ponta da Barreira Vermelha (Molembo) e o cabo do Paul; e, ao aproximar-se do Zaire, cuja presença lhe foi anunciada pela corrente caudalosa do rio, “que a vinte léguas da costa se acham as suas águas doces”, torneou estas, entrando no estuário de margens rasas, surgido como aparição convidativa e acariciadora. Resultando da confluência de vários rios, de caudal formidável e impetuoso, o Zaire estava enxameado de almadias de negros, transportes fluviais predilectos do território.

Os marinheiros desceram na margem esquerda, coalhada de gente estupefacta; e, tanto por mímica como por palavras, Diogo Cão soube encontrarem-se em terras do grande Manicongo, 5 cuja residência ficava no interior do país, as quais os Portugueses logo baptizaram com o nome de Congo.

Depois das primeiras impressões e dos primeiros contactos, surgiram, naturalmente, as primeiras deliberações, inerentes à missão espinhosa: o rio foi distinguido com o nome de rio Poderoso, devido ao seu volume de água; 6 e na foz, numa ponta, foi colocado o padrão de São Jorge, sítio baptizado, mais tarde, com o nome de ponta ou cabo do Padrão. 7

Até ali, a posse da costa fora atestada por cruzes de madeira; de então em diante, a pedra substituiu o lenho, pela duração do material, provável inspiração dos padrões romanos do Norte de Portugal, que marcavam as distâncias das estradas.

Salientado com o nome do santo devoto do rei, o padrão era encimado por um capitel, em forma de paralelipípedo, tendo numa das faces as armas reais e nas outras o nome do monarca que ordenara o descobrimento, a data e o nome do capitão que o praticara: “Na era da criação do mundo de 6681 anos, do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de 1482 anos, o mui alto, mui excelente e poderoso príncipe el-rei D. João II de Portugal mandou descobrir esta terra e pôr estes padrões por Diogo Cão, escudeiro de sua casa.” 8

Estava-se, possivelmente, em fins de Maio de 1483.

O príncipe do Sonho, habitando a foz do rio, no lugar de Praza, foi o primeiro régulo com quem privou Diogo Cão, dentro da mais cativante cordialidade; boas relações que permitiram, ao capitão, a escolha e o envio de uma pequena embaixada a Manicongo, com presentes e notícias da chegada da armada de el-rei de Portugal. Vivendo em amizada com todo o mundo, o soberano português solicitava também a do famoso chefe, desejando ter com ele e junto dele todo o trato e prestança. 9

Enquanto os seus emissários se internavam no Congo, para visitar Nzinga-a-Cuum, o descobridor do Zaire continuou a viagem para o sul.

[…]

Regresso, à Metrópole, de Diogo Cão

Os emissários portugueses enviados à corte de Nzinga-a-Cuum foram recebidos festivamente; e tão grande prazer causou a sua visita, tanto os desejou ouvir o monarca negro, que os reteve, na capital, sem licença para voltarem à beira-mar.

Neste ínterim, Diogo Cão alcançou o Zaire, de retorno a Lisboa; e, não encontrando os seus mensageiros, supô-los aprisionados ou mortos, resolvendo continuar a viagem para o norte. No entanto, como os pretos do Sonho entravam e saíam dos navios, a seu talante, confiados nos marinheiros, prendeu quatro e levou-os para Portugal. Não os tomou, porém, como cativos, mas esperançado em civilizá-los, para os trazer de novo ao seu país; e dos seus projectos deu conhecimento às gentes da terra, prometendo restituí-los, com muita honra e riqueza, quando passassem quinze luas. Por esta forma o capitão assegurou a integridade dos companheiros retidos no interior do território, na hipóteses de ainda serem vivos.

À chegada a Portugal, os Congueses foram carinhosamente recebidos, como foram esplendidamente tratados a bordo. D. João II exultou, ao vê-los, representantes que eram da fidalguia conguesa. Vestiram-nos com boas fazendas; dispensaram-lhes atenções cativadoras; e confirmaram-lhes as promessas do navegador, feitas à partida do Zaire, com ensino dos usos portugueses e das práticas religiosas e com o contacto com algumas realidades nacionais.

Decorridos alguns meses, Diogo Cão recebeu instruções para voltar ao Congo, em cumprimento da sua palavra honrada.



1. História de Angola, Edições Afrontamento, Porto, 1975, pg. 50. Obra atribuída ao MPLA e editada originalmente em Argel.

2. Diogo Cão levou para Portugal alguns congoleses. [Nota da o.c.]

3. DELGADO, Ralph. História de Angola, 1º Volume, Primeiro Período e Parte do Segundo 1482 a 1607, Edição do Banco de Angola, pgs. 61 a 65. A obra não apresenta a data de edição. Abre, no entanto, com a “Introdução da Primeira Edição”, Benguela, 30 de Junho de 1946.

4. Gonçalo Cão, companheiro de armas de D. João I, a quem foi doada Badajoz. [Nota da o.c.]

5. Senhor do Congo. Aportuguesamento de Muene-Econgo. Há várias sugestões para a proveniência desta palavra: Capelo e Ivens derivam-na da palavra dos Ambundos designativa de tributário; Holman Bentley de ukong, caçador, quer no Ambundo, quer no Conguês; F. Nogueira de kong, plural de makongo, prisioneiro; Luís Figueira considera-a um título hierárquico, como seculo, cuja tradução diz ser Príncipe Velho: (ekongo-Velho); a história conguesa de um cura do Sunde, de fins do século XVI, princípios do século XVII, publicada por Felner, esclarece que Motino-Bene, o unificador do território, “se foi para a cidade do Congo, da qual o rei toma o nome, onde residia o pontífice daquela gentilidade chamado Mani-cabunga, e casou com uma filha sua.” No texto seguiu-se a versão do cura do Sunde. [Nota da o.c.]

6. Os Congueses chamavam Engaze ao rio Zaire, segundo o Esmeraldo. Zaire é corrupção de Nzade ou Nzare, que significa rio que engole todos os outros. [Nota da o.c.]

7. Este padrão foi destruído pelos Holandeses quando ocuparam Angola, restando dele apenas fragmentos, guardados na Sociedade de Geografia.

8. Inscrição do Padrão de Santo Agostinho. [Nota da o.c.] Este padrão foi colocado a 28 de Agosto no cabo do Lobo.

9. Duarte Pacheco, no Esmeraldo, deixou-nos estas notícias do Congo: “Nesta terra de Manicongo não há ouro nem sabem que é, mas nela há razoavelmente cobre muito fino e aqui há muitos elefantes e ao elefante chamam Zaão os dentes dos quais resgatamos e assim o cobre por lenço ao qual os negros desta terra chamam molele; neste reino do Congo se fazem uns panos de palma de pêlo como veludo e deles com lavores como cotim aveludado, tão formosos que a obra deles se não faz melhor feita em Itália; e em toda a outra Guiné não há terra em que saibam fazer estes panos senão neste reino do Congo; nesta terra se resgatam alguns escravos em pouca quantidade e até agora não sabemos que aqui haja outra mercadoria.” [Nota da o.c.]